26/12/2024 –
Proposta visa ampliar acesso à terapia oral que reduz o excesso de ferro do organismo de pacientes que fazem transfusões de sangue frequentes
A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) abriu uma consulta pública para ouvir a sociedade civil e a classe médica até o dia 7 de janeiro de 2025 sobre a ampliação do uso da deferiprona para o tratamento da sobrecarga de ferro em pacientes com doença falciforme na rede pública de saúde.
A deferiprona é um quelante (termo que significa “garra” ou “pinça”, referindo-se à capacidade desses compostos aprisionarem metais e tornarem viável sua eliminação do organismo) oral indicado para remover o excesso de ferro do organismo. De acordo com especialistas, a sobrecarga de ferro é uma complicação comum em pessoas com doença falciforme que precisam fazer transfusões sanguíneas regulares para prevenir ou controlar a anemia severa, as dores intensas e as infecções frequentes causadas pela patologia. O excesso de ferro está associado a danos significativos em órgãos vitais como fígado, coração e rins, o que aumenta os riscos de morbidade e mortalidade.
A doença falciforme é uma condição genética e hereditária que representa um grande desafio para o sistema de saúde, com prevalência de 2% a 8% da população. Estima-se que atualmente entre 60 mil e 100 mil pessoas vivam com anemia falciforme no país, sendo que a doença é mais comum na Bahia, no Distrito Federal e em Minas Gerais. Todos os anos, cerca de 3,5 mil crianças nascem com a condição no Brasil.
Segundo estudo publicado na revista científica Blood Advances, a anemia falciforme, que afeta majoritariamente negros e pardos, está associada a uma redução significativa da expectativa de vida. Enquanto a expectativa média de vida da população brasileira é de 69 anos, pessoas com doença falciforme vivem cerca de 32 anos.
As internações por doença falciforme no Brasil cresceram 47% entre 2012 e 2023, atingindo um pico de 14,9 mil hospitalizações em 2023. A maioria das hospitalizações (74,7%) foi de pessoas negras e cerca de 50% de crianças e adolescentes de até 14 anos.
A mortalidade por doença falciforme também aumentou nos últimos anos, alcançando 5,6 mil óbitos entre 2012 e 2023. A média mensal de mortes na população negra é 4,8 vezes maior do que na população branca, o que destaca a necessidade de políticas públicas direcionadas a reduzir as desigualdades raciais e melhorar o acesso aos cuidados de saúde. Dos óbitos causados pela doença, 37,5% são registrados em menores de nove anos de idade.
Pacientes que seguem corretamente a terapia com quelantes de ferro apresentam redução das internações e das visitas ao pronto-socorro. A adesão ao tratamento contribui para a prevenção de complicações graves e diminui os custos com tratamentos mais onerosos.
Fábio Henrique Almeida da Conceição, 45 anos, residente em Belém (PA), vive com a doença falciforme e enfrentou inúmeros desafios ao longo de seu tratamento. Após diversas reações adversas, como náuseas e desconfortos causados por outras terapias, encontrou na deferiprona uma solução mais adequada às suas necessidades. “Antes, eu passava cerca de dez horas no ambulatório para as infusões intravenosas, o que tornava minha rotina extremamente difícil. Além disso, os efeitos colaterais eram intensos. Com o medicamento oral, a experiência foi totalmente diferente: me adaptei rapidamente e ele trouxe mais qualidade para o meu dia a dia”, compartilha em relato feito durante a plenária da Conitec.
Os quelantes orais se destacam por sua praticidade em relação aos intravenosos, que exigem infusões que podem levar várias horas e devem ser feitas com supervisão médica em unidades de saúde. Em contraste, os quelantes de ferro orais permitem que o paciente administre o medicamento de maneira independente, onde estiver, constituindo uma alternativa mais conveniente e menos invasiva.
“A inclusão da terapia no SUS representa um avanço importante no tratamento dos pacientes com doença falciforme, pois permitirá um melhor controle da sobrecarga de ferro, evitando complicações graves associadas”, afirma a Dra. Monica Veríssimo, especialista em Hematologia e Hemoterapia Pediátrica.
A deferiprona pode ser usada isoladamente ou em combinação, quando outros quelantes não forem efetivos ou quando houver necessidade de correção rápida ou intensiva dos níveis de ferro para prevenção ou tratamento de consequências fatais da sobrecarga de ferro cardíaca, renal ou hepática.
Para a Dra. Mônica, a consulta pública é uma oportunidade crucial para que a sociedade civil, profissionais de saúde, pacientes e familiares contribuam com experiências e opiniões que podem influenciar as decisões públicas sobre Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS). “É essencial que a sociedade participe da consulta pública para garantir o acesso dos pacientes a terapias que podem transformar suas condições de saúde e qualidade de vida”, reforça a médica.
A participação pode ser realizada por meio do link, e as contribuições devem ser enviadas até o dia 7 de janeiro de 2025.
Website: https://www.gov.br/participamaisbrasil/consulta-publica-conitec-sectics-n-100-2024-deferiprona-para-o-tratamento-da-sobrecarga-de-ferro-na-doenca-falciforme